quarta-feira, 28 de novembro de 2012

O MANUAL DO BRUXO - ALLAN ZOLA KRONZEK - 31







Para a maioria de nós, espelhos são a coisa mais natural do mundo. Não esperamos que eles nos revelem os desejos mais profundos nossos corações, como faz o Espelho de Ojesed, nem esperamos que falem conosco, como o espelho da rainha má em "Branca de Neve".



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Para a maioria de nós, espelhos são a coisa mais natural do mundo. Não esperamos que eles nos revelem os desejos mais profundos nossos corações, como faz o Espelho de Ojesed, nem esperamos que falem conosco, como o espelho da rainha má em "Branca de Neve". Usamos os espelhos para tarefas cotidianas, como escovar os dentes, pentear o cabelo, e nem paramos para pensar neles. Mas a presença dos espelhos entre nós nem sempre foi aceita com tanta naturalidade.
Nos primórdios da história, as pessoas só podiam ver sua própria imagem refletida nos poços de água parada e dificilmente compreendiam o que estavam vendo de fato. Muitas culturas antigas acreditavam que os reflexos eram almas humanas (que, para elas, podiam existir de forma totalmente independente do corpo da pessoa). Em certas sociedades, inclusive na Grécia antiga, considerava-se perigoso ver o próprio reflexo, pois isso significava que a alma havia deixado o corpo e corria o risco de ser capturada por espíritos malignos ou por ninfas aquáticas.
Não é surpresa, então, que quando os primeiros espelhos fabricados pelo homem surgiram, há cerca de 4.500 anos, tenham sido vistos como objetos mágicos milagrosos. (A palavra espelho em inglês, mirror, vem do termo latino mirari ou mirus, que significa "maravilhoso".) Os antigos gre­gos, romanos, chineses, egípcios e as culturas da América Central acre­ditavam que os espelhos eram talismãs poderosos, capazes de enfeitiçar as mentes dos homens, estontear os espíritos malignos e aniquilar a alma dos vivos e dos mortos. Acreditava-se até que o deus asteca da noite, Tzcatlipoca, levava consigo um espelho mágico que envolvia seus inimi­gos em nuvens de fumaça.
Até o século XVII, época em que foram aos poucos suplantados pela bola de cristal, os espelhos também eram muito usados para prever o futuro. O primeiro caso registrado de adivinhação por meio de um espelho (prática conhecida como catoptromancia) remonta à Roma anti­ga, onde se usavam espelhinhos de metal para calcular a expectativa de vida dos doentes e dos idosos. Segundo o relato do viajante grego Pausânias, do século II, os videntes romanos punham seus espelhos den­tro de um poço de água, depois os colocavam diante do rosto da pessoa doente. Se o reflexo da pessoa aparecesse normal, significava que iria se recuperar; se aparecesse distorcido, sem dúvida morreria.
A catoptromancia atingiu o auge de sua popularidade por volta de 1200, logo depois que os vidraceiros venezianos aperfeiçoaram a arte de fabricar espelhos grandes e planos. Os catoptromantes europeus incli­navam seus espelhos na direção do sol ou de alguma fonte de luz e então "liam o futuro" nos desenhos cifrados formados pela luz e pelas sombras que viam refletidos ali. Segundo Johannes Hartlieb, um sábio alemão do século XV, alguns videntes que tinham visões no cristal também se diziam capazes de criar espelhos encantados que podiam mostrar aos homens qualquer coisa que desejassem.
No século XIII, os espelhos ficaram tão ligados à catoptromancia e a outras formas de magia que uma das primeiras perguntas feitas nos jul­gamentos medievais por crime de bruxaria era: "Você já fez experiências com espelhos?" Mas, ao mesmo tempo, o famoso filósofo cristão Tomás de Aquino via os espelhos como uma ferramenta de esclarecimento e argumentava que estudar a própria imagem podia aumentar a autocons­ciência e ajudar a pessoa a compreender melhor o seu lugar no mundo. (De fato, Tomás de Aquino ajudou a cunhar a palavra "especular", que significa refletir ou ponderar. Em latim, especular significa, literalmente, contemplar um especulam, ou espelho.)
Muitos contos folclóricos europeus e muitas obras literárias também retratam os espelhos como instrumentos de conhecimento, apresentan­do-os como janelas para verdades importantes, terras remotas e maravi­lhas inimagináveis. No conto medieval "Parsifal", o guardião do Cálice Sagrado consegue identificar seus inimigos aproximando deles um "espelho de inimigo", bem parecido ao que pertence a Olho-Tonto Moody. A Bela, de "A Bela e a Fera", se consola da solidão vendo sua família em um espelho encantado. Mesmo o espelho do conto "Branca de Neve" serve como um instrumento da verdade e do autoconheci­mento, ao informar rudemente à inimiga de Branca de Neve que ela não é mais a mulher mais bela do reino. (É claro que alguns espelhos falantes são mais francos do que outros. O espelho que está no quarto de Harry Potter, no Caldeirão Furado, não se preocupa com rimas bonitas ou fra­ses diplomáticas. Basta o espelho dar uma olhada no cabelo de Harry Potter para ir logo dizendo que ele é um caso perdido!)
Talvez a história mais popular já escrita a respeito de um espelho mágico seja Através do Espelho, de Lewis Carroll, na qual uma menina chamada Alice atravessa o espelho do seu quarto para entrar no mundo mágico do espelho, em que tudo e todos estão ao contrário. As pessoas andam de marcha à ré, lêem de trás para a frente e até furam os dedos e gritam de trás para diante! Os espelhos, é claro, invertem a posição de tudo, o que explica por que, no mundo do espelho, o Espelho de O-j-e-s-e-d reflete o D-E-S-E-J-O.


Pedra Filosofal, 12



 Superstições do Espelho

Hoje, a ciência da ótica pôs fim à maior parte do mistério que havia nos espelhos. Mas algumas superstições populares ainda sobrevivem, para nos recordar a sua magia. Eis as dez superstições entre as mais comuns de todos os tempos.

1. Quebrar um espelho traz sete anos de azar. Essa crença teve origem no século I, com os romanos, que acrescentaram os sete anos a uma superstição grega anterior. Mas o azar pode ser evitado, enterrando um caco do espelho.

2. Quando um espelho cai da parede, é sinal de que alguém vai morrer em breve.

3. Os espelhos devem ficar cobertos durante as tempestades, para não atrair raios.
4. Vampiros e bruxas não são refletidos pelos espelhos porque não têm alma.
5. Os espelhos podem aprisionar a alma humana e devem ficar cobertos quando alguém morre.
6. Um espelho que só tem moldura em três lados foi usado por alguma bruxa para ver algo a longa distância.
7. Não se deve deixar que um bebê veja a própria imagem no primeiro ano de vida, para que sua alma jovem não seja su­gada para dentro do espelho.
8. Depois de vestida para o casamento, a noiva só pode ver a própria imagem refletida no espelho após a cerimônia, senão terá azar.
9. Dá azar olhar para o espelho à luz de velas, sobretudo no Dia das Bruxas.
10. Para sonhar com o seu futuro amor, durma com um espe­lho embaixo do travesseiro.






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