— CAPÍTULO DEZ —
O DIA DAS BRUXAS
DRACO NÃO CONSEGUIA ACREDITAR em seus olhos quando viu que Harry e Rony continuavam em Hogwarts no dia seguinte, parecendo cansados, mas absolutamente felizes. De fato, na manhã seguinte Harry e Rony começaram a achar que o encontro com o cachorro de três cabeças fora uma excelente aventura e estavam prontos para outra.
Entrementes, Harry contou a Rony sobre o pacotinho que parecia ter sido levado de Gringotes para Hogwarts, e passaram muito tempo pensando no que poderia precisar de tanta proteção.
— Ou é uma coisa realmente valiosa ou realmente perigosa — falou Rony.
— Ou as duas — acrescentou Harry.
Mas como só o que sabiam com certeza sobre o misterioso objeto era que media uns cinco centímetros de comprimento, não tinham muita possibilidade de adivinhar o seu conteúdo sem outras pistas. Nem Neville nem Hermione mostraram o menor interesse pelo que estava sob os pés do cachorro e do alçapão. Neville só estava interessado em quando iria chegar perto do cachorro outra vez. Hermione agora se recusava a falar com Harry e Rony, mas era uma menina tão mandona e metida a saber de tudo que eles encararam sua atitude como um prêmio. Agora só o que realmente queriam era descobrir um jeito de se vingar do Draco, e para sua grande satisfação, a oportunidade chegou pelo correio mais ou menos uma semana depois.
Quando as corujas invadiram o Salão como de costume, a atenção de todos foi atraída por um longo pacote carregado por seis corujonas.
NÃO ABRA O PACOTE À MESA. Ele contém a sua nova Nimbus 2000, mas não quero que todo o mundo saiba que você ganhou uma vassoura ou todos vão querer uma. Olívio Wood vai esperá-lo hoje à noite às sete horas no campo de Quadribol para a sua primeira sessão de treinamento.
Profª. Minerva McGonagall.
Harry teve dificuldade em esconder a alegria quando passou o bilhete para Rony ler.
— Uma Nimbus 2000! — Rony gemeu de inveja — Eu nunca nem pus a mão em uma.
Os dois saíram depressa do salão, querendo desembrulhar a vassoura sozinhos antes da primeira aula, mas no meio do Saguão de Entrada encontraram o caminho barrado por Crabbe e Goyle.
Draco tirou o pacote de Harry e apalpou-o.
— É uma vassoura — falou, atirando-o de volta a Harry com uma expressão de inveja e despeito no rosto — Você vai se ferrar desta vez, Potter, alunos do primeiro ano não podem ter vassouras.
Rony não conseguiu resistir.
— Não é uma vassoura velha qualquer, é uma Nimbus 2000. Que foi que você disse que tem em casa, Draco, uma Comet 260? — Rony riu para Harry — A Comet enche os olhos, mas não tem a mesma classe da Nimbus.
— Que é que você entende disso Weasley? Você não poderia comprar nem a metade do cabo. Vai ver você e seus irmãos têm que economizar para comprar palha por palha.
Antes que Rony pudesse responder, o Prof. Flitwick apareceu ao lado de Draco.
— Não estão brigando, meninos, espero — falou com voz esganiçada.
— Potter recebeu uma vassoura, professor — disse Draco, depressa.
— Eu sei — respondeu o Prof. Flitwick, abrindo um grande sorriso para Harry — A Profª. McGonagall me falou das circunstâncias especiais, Potter. E qual é o modelo?
— Uma Nimbus 2000, professor — informou Harry, lutando para não rir da expressão horrorizada no rosto de Draco — E, para falar a verdade, foi graças ao Draco aqui que ganhei a vassoura — acrescentou.
Harry e Rony subiram as escadas sufocando o riso diante da raiva e confusões visíveis de Draco.
— É verdade — disse Harry, caindo na gargalhada, quando chegaram ao alto da escadaria de mármore — Se ele não tivesse roubado o Lembrol do Neville, eu não estaria no time.
— Então suponho que você ache que ganhou um prêmio por desobedecer ao regulamento? — ouviu-se uma voz zangada logo atrás deles. Hermione subia com passos decididos a escadaria, olhando com desaprovação para o pacote nas mãos de Harry.
— Pensei que você não estava falando com a gente — comentou Harry.
— E continue a não falar — falou Rony — Está fazendo tanto bem a gente.
Hermione se afastou com o nariz empinado.
Harry teve muita dificuldade em se concentrar nas aulas daquele dia. Seus pensamentos não paravam de vagar até o dormitório onde guardara a vassoura debaixo da cama, ou de se desviarem para o campo de Quadribol onde iria aprender a jogar. Jantou depressa à noite, sem ao menos reparar no que estava comendo e, em seguida, correu até o quarto com Rony para finalmente desembrulhar a Nimbus 2000.
— Uau! — suspirou Rony, quando a vassoura apareceu na cama de Harry.
Até Harry, que não entendia nada de vassouras e suas diferenças, achou que a Nimbus tinha uma aparência fantástica. Aerodinâmica e reluzente com um cabo de mogno, a vassoura tinha uma longa cauda de palhas limpas e retas e a marca Nimbus 2000 escrita a ouro próximo ao punho.
Quando eram quase sete horas, Harry saiu do castelo e se dirigiu ao campo de Quadribol no lusco-fusco. Nunca estivera no estádio antes. Havia centenas de lugares em uma arquibancada em volta do campo de modo que os espectadores viam o que acontecia do alto. Em cada ponta do campo havia três balizas douradas com aros no topo, lembraram a Harry os canudinhos de plástico que as crianças trouxas usavam para soprar bolinhas de sabão, só que tinham mais de 15 metros de altura.
Ansioso demais para esperar Olívio sem voar, Harry montou a vassoura e deu um impulso. Que sensação, ele mergulhou pelas balizas, subiu e desceu pelo campo. A Nimbus 2000 ia aonde ele queria ao menor toque.
— Ei, Potter, desça!
Olívio Wood chegara. Carregava uma grande caixa de madeira debaixo do braço.
Harry pousou ao lado dele.
— Muito bom — comentou Olívio, os olhos brilhando — Estou vendo o que foi que McGonagall quis dizer... você realmente tem um talento natural. Hoje à noite só vou lhe ensinar as regras do jogo, depois você vem aos treinos do time três vezes por semana.
Ele abriu a caixa. Dentro havia quatro bolas de tamanhos diferentes.
— Certo — disse Olívio — O Quadribol é muito fácil de entender, mesmo que não seja fácil de jogar. Tem sete jogadores de cada lado. Três deles são artilheiros.
— Três artilheiros — Harry repetiu, enquanto Olívio apanhava uma bola muito vermelha do tamanho aproximado de uma bola de futebol.
— Esta bola se chama goles — explicou Olívio — Os artilheiros atiram a goles um para o outro e tentam metê-la em um dos aros para marcar um gol. Dez pontos todas as vezes que a goles passa por um dos aros. Está me acompanhando?
— Os artilheiros atiram a goles pelos aros para marcar pontos — repetiu Harry — Então é como um basquete com seis cestas e vassouras, não é?
— O que é basquete? — perguntou Olívio curioso.
— Deixa pra lá — disse Harry na mesma hora.
— Agora, tem outro jogador, um para cada lado, que é chamado goleiro. Eu sou o goleiro da Grifinória. Tenho que voar em volta dos aros para impedir que o outro time marque pontos.
— Três artilheiros, um goleiro — disse Harry, que estava decidido a decorar tudo — E jogam uma goles, Ok, entendi. E essas para que servem? — apontou para as três bolas restantes na caixa.
— Vou lhe mostrar agora. Segure aqui.
Ele entregou um pequeno bastão a Harry, meio parecido com um bastão de beisebol.
— Vou lhe mostrar o que os balaços fazem. Essas duas aqui são os balaços.
E mostrou a Harry duas bolas iguais, pretas e ligeiramente menores do que a goles vermelha. Harry reparou que elas pareciam estar fazendo força para se livrar das correntes que as prendiam na caixa.
— Fique longe — Olívio preveniu Harry. Ele se curvou e soltou um dos balaços.
Na mesma hora, a bola preta saiu voando e em seguida desceu direto contra o rosto de Harry. Harry golpeou-a como bastão para impedi-la de quebrar o seu nariz e mandou-a ziguezagueando para longe, ela passou veloz pelas cabeças deles e, em seguida, atirou-se contra Olívio, que mergulhou sobre ela e conseguiu imobilizá-la no chão.
— Está vendo? — Olívio ofegou, forçando o balaço indócil de volta à caixa e passando a correia para prendê-lo — Os balaços voam pelo ar tentando derrubar os jogadores das vassouras. É por isso que tem dois batedores em cada time. Os gêmeos Weasley são os nossos. A função deles é proteger o time dos balaços e tentar rebatê-los para o outro time. Então, acha que guardou tudo?
— Três artilheiros tentam marcar pontos com a goles, o goleiro guarda as balizas, os batedores afastam os balaços do seu time — Harry repetiu como um gravador.
— Muito bem.
— Hum... os balaços já mataram alguém? — perguntou Harry, esperando parecer displicente.
— Nunca em Hogwarts. Já tivemos uns queixos quebrados, mas nada mais sério. Agora, o último membro da equipe é o apanhador: você. E você não tem que se preocupar com a goles nem com os balaços.
— A não ser que rachem a minha cabeça.
— Não se preocupe, os Weasley são uma parada para os balaços, quero dizer, eles parecem uns balaços humanos.
Olívio meteu a mão no caixote e tirou a quarta e última bola. Comparada com a goles e os balaços, era pequenininha, mais ou menos do tamanho de uma noz. Era de ouro polido e tinha asinhas de prata que se agitavam.
— Este é o Pomo de Ouro, e é a bola mais importante de todas. É muito difícil de se apanhar porque é veloz e pouco visível. A função dos apanhadores é agarrá-la. Eles têm que se meter entre os artilheiros, batedores, balaços e a goles para agarrá-lo antes do apanhador do time contrário, porque o apanhador que agarra o Pomo ganha para o seu time mais cento e cinqüenta pontos, o que praticamente lhe dá a vitória. É por isso que os apanhadores levam tantas faltas. Um jogo de Quadribol só termina quando o Pomo é apanhado, o que pode demorar uma eternidade. Acho que o recorde é três meses e precisaram arranjar substitutos para os jogadores poderem dormir um pouco — explicou Olívio — É isso aí, alguma pergunta?
Harry sacudiu a cabeça. Compreendeu muito bem o que tinha de fazer. Fazer é que ia ser o problema.
— Não vamos praticar com o pomo — disse Olívio, guardando-o cuidadosamente de volta na caixa — Está escuro demais e poderíamos perdê-lo. Vamos experimentar com outras bolas.
E tirou do bolso um saco de bolas comuns de golfe e alguns minutos depois ele e Harry estavam no ar, Olívio atirando as bolas com toda a força para todos os lados e Harry apanhando-as. Harry não perdeu nenhuma, e Olívio ficou encantado. Passou-se meia hora, a noite chegou e eles não puderam continuar.
— Aquela Taça de Quadribol terá o nosso nome este ano — disse Olívio feliz quando voltavamcansados ao castelo — Eu não me espantaria se você se saísse melhor que Carlinhos, e ele poderia ter jogado na seleção da Inglaterra se não tivesse ido embora caçar dragões.
* * *
Talvez fosse porque agora andava muito ocupado com o treino de Quadribol três noites por semana além dos deveres de casa, mas Harry nem acreditou quando se deu conta de que já estava em Hogwarts havia dois meses. O castelo parecia mais sua casa do que a casa da tia na Rua dos Alfeneiros. As aulas, também, estavam se tornando cada dia mais interessantes, agora que dominara os conhecimentos básicos.
Na manhã do Dia das Bruxas eles acordaram com um delicioso cheiro de abóbora assada que se espalhava pelos corredores.
E, o que era ainda melhor, o Prof. Flitwick anunciou na aula de Feitiços que, em sua opinião, os alunos estavam prontos para começar a fazer objetos voarem, uma coisa que andavam morrendo de vontade de experimentar desde que viram o professor fazer o sapo de Neville sair voando pela sala.
O Prof. Flitwick dividiu a turma em pares para praticar. O parceiro de Harry foi Simas Finnigan (um alívio, porque Neville tinha tentado atrair sua atenção). Mas Rony teria que trabalhar com Hermione Granger. Era difícil dizer se era Rony ou Hermione que estava mais aborrecido com isso. Ela não falava com nenhum dos dois desde o dia em que a vassoura de Harry chegara.
— Agora, não se esqueçam daquele movimento com o pulso que praticamos! — falou esganiçado o Prof. Flitwick, como sempre empoleirado no alto da pilha de livros — Gira e sacode, lembrem-se, gira e sacode. E digam as palavras mágicas corretamente, é muito importante, também, lembrem-se do bruxo Barrufo, que disse “s” em vez de “f” e quando viu estava no chão com um búfalo em cima do peito.
Era muito difícil. Harry e Simas giraram e sacudiram o pulso, mas a pena que deviam mandar para o alto continuava parada em cima da mesa. Simas ficou tão impaciente que a empurrou com a varinha e tocou fogo nela. Harry teve que apagar o fogo com o chapéu.
Rony na mesa ao lado, não estava tendo muita sorte.
— Vingardium lenviosa! — ordenou, sacudindo os braços compridos como pás de moinho.
— Você está dizendo o feitiço errado — Harry ouviu Hermione corrigir aborrecida — É vin-gar-diumlevi-o-sa. É bem pronunciado e longo.
— Diz você então, que é tão sabichona — retrucou Rony.
Hermione enrolou as mangas das vestes, bateu a varinha e disse:
— Vingardium leviosa!
A pena se ergueu da mesa e pairou a mais de um metro acima da cabeça deles.
— Ah, muito bem! — exclamou o Prof. Flitwick, batendo palmas — Pessoal, olhe aqui, a Hermione Granger conseguiu!
Rony estava de muito mau humor na altura em que a aula terminou.
— Não admira que ninguém suporte ela — disse a Harry quando procuravam chegar ao corredor — Francamente, ela é um pesadelo.
Alguém deu um esbarrão em Harry ao passar.
Era Hermione.
Harry viu seu rosto de relance e ficou assustado ao ver que ela estava chorando.
— Acho que ela ouviu o que você disse.
— E daí! — mas pareceu meio sem graça — Ela já deve ter reparado que não tem amigos.
Hermione não apareceu na aula seguinte e ninguém a viu a tarde inteira. Ao descerem ao Salão Principal para a Festa das Bruxas, Harry e Rony ouviram Parvati contar à amiga Lilá que Hermione estava chorando no banheiro das meninas e queria que a deixassem em paz. Rony ficou ainda mais sem graça ao ouvir isso, mas no momento seguinte entraram no Salão Principal, onde as decorações do Dia das Bruxas tiraram Hermione de suas cabeças.
Mil morcegos vivos esvoaçavam nas paredes e no teto e outros mil mergulhavam sobre as mesas em nuvens negras e baixas, fazendo dançarem as velas dentro das abóboras. A comida apareceu de repente nos pratos de ouro, como acontecera no banquete de abertura das aulas.
Harry estava se servindo de uma batata assada em casca quando o Prof. Quirrell entrou correndo no Salão, o turbante torto na cabeça e o terror estampado no rosto. Todos olharam quando ele se aproximou da cadeira de Dumbledore, escorou-se na mesa e ofegou.
— Trasgo... nas masmorras... achei que devia lhe dizer — em seguida desabou no chão desmaiado.
Houve um alvoroço. Foi preciso explodirem várias bombinhas da ponta da varinha do Prof. Dumbledore para as pessoas fazerem silêncio.
— Monitores — disse ele com voz grave e retumbante — Levem os alunos de suas casas de volta aos dormitórios, imediatamente!
Era com Percy mesmo.
— Me acompanhem! Fiquem juntos, alunos do primeiro ano! Não precisam ter medo do trasgo se seguirem as minhas ordens! Agora fiquem bem atrás de mim. Abram caminho para os alunos do primeiro ano passarem! Com licença, sou o monitor!
— Como é que um trasgo pode entrar? — perguntou Harry enquanto subiam a escadaria.
— Não me pergunte, dizem que eles são bem burros — respondeu Rony — Vai ver o Pirraça deixou ele entrar para pregar uma peça no Dia das Bruxas.
Eles passaram por diferentes grupos de pessoas que se apressavam em diferentes direções. Enquanto lutavam para passar por um bolinho de alunos de Lufa-Lufa, Harry de repente agarrou o braço de Rony.
— Acabei de me lembrar da Hermione.
— O que tem ela?
— Ela não sabe que tem um trasgo aqui.
Rony mordeu o lábio.
— Ah, está bem — falou ríspido — Mas é melhor Percy não ver a gente.
Abaixando-se, eles se misturaram aos alunos da Lufa-Lufa que iam à direção contrária, escapuliram por um lado deserto do corredor e correram para os banheiros das meninas. Tinham acabado de virar um canto quando ouviram passos apressados atrás deles.
— Percy! — sibilou Rony, puxando Harry para trás de um enorme grifo de pedra.
Espiando para os lados, no entanto, viram não Percy, mas Snape. Ele atravessou o corredor e desapareceu de vista.
— Que é que ele está fazendo? — cochichou Harry — Por que não está lá embaixo com os outros professores?
— Não me pergunte.
O mais silenciosamente possível, eles se esgueiraram pelo próximo corredor nas pegadas de Snape.
— Ele está indo para o terceiro andar — disse Harry, mas Rony levantou a mão.
— Você está sentindo um cheiro?
Harry fungou e um fedor horrível invadiu suas narinas, uma mistura de meias velhas e banheiro público que parece que nunca é limpo. E em seguida ouviram um grunhido baixo e passadas de pés gigantescos.
Rony apontou no fim do corredor, à esquerda, alguma coisa enorme estava vindo em sentido contrário. Eles se encolheram no escuro e procuraram ver o que era quando a coisa passou por um trecho iluminado pelo luar.
Era uma visão medonha. Quase quatro metros de altura, a pele cinzenta e baça, o corpanzil cheio de calombos como um pedregulho e uma cabecinha no alto, que mais parecia um coco. Tinha pernas curtas, grossas como um tronco de árvore e pés chatos e calosos. Segurava um enorme bastão de madeira, que arrastava pelo chão, porque seus braços eram compridíssimos.
O trasgo parou próximo a uma porta e espiou para dentro. Abanou as longas orelhas, tentando fazer a cabeça minúscula pensar, depois entrou devagar na sala.
— A chave está na porta — murmurou Harry — Podíamos trancá-lo lá dentro.
— Boa idéia — concordou Rony, nervoso.
Eles se esgueiraram até a porta aberta, as bocas secas, rezando para o trasgo não resolver sair naquele instante. Com um grande salto, Harry conseguiu agarrar a chave, bater a porta e trancá-la seguramente.
— Pronto!
Afogueados com a vitória, começaram a correr de volta pelo corredor, mas ao chegarem num canto ouviram uma coisa que fez seus corações pararem, um grito alto e enregelante, e vinha da sala que tinham acabado de trancar.
— Ah, não — exclamou Rony, pálido como o Barão Sangrento.
— Vêm do banheiro das meninas.
— Hermione!— disseram os dois juntos.
Era a última coisa que queriam fazer, mas que escolha tinham? Dando meia-volta, correram até a porta e giraram a chave, atrapalhados de tanto pânico. Harry escancarou aporta e entraram correndo.
Hermione estava encolhida contra a parede oposta, parecendo prestes a desmaiar. O trasgo avançava para ela, derrubando as pias que estavam na parede em seu caminho.
— Distraia ele!— Harry pediu desesperado a Rony, e, agarrando uma torneira, atirou-a com toda a força contra a parede.
O trasgo parou a um metro de Hermione. Virou-se com lentidão, piscando sem entender, procurou ver que barulho era aquele. Seus olhinhos malvados viram Harry. Ele hesitou, em seguida partiu para cima de Harry, erguendo o bastão.
— Oi cabeça de ervilha! — berrou Rony do outro lado do banheiro, e atirou contra ele um cano de metal.
O trasgo nem pareceu sentir o cano bater no seu ombro, mas ouviu o berro e parou outra vez, virando o focinho feio para Rony, e dando a Harry tempo para correr em volta dele.
— Vamos, corra, corra! — Harry gritou para Hermione, tentando puxá-la na direção da porta, mas ela não conseguia se mexer continuava achatada contra a parede, a boca aberta de terror.
Os gritos e os ecos pareciam estar deixando o trasgo enlouquecido. Ele rugiu de novo e avançou para Rony que estava mais perto e não tinha jeito de escapar.
Harry então fez uma coisa que era ao mesmo tempo muito corajosa e muito idiota, tomou impulso e deu um salto conseguindo abraçar o pescoço do trasgo pelas costas. O trasgo não sentiu Harry pendurar-se ali, mas até um trasgo percebe quando se espeta um pedaço comprido de pau dentro da narina, e a varinha de Harry ainda estava na mão quando ele saltou e entrou direto na narina do trasgo.
Urrando de dor, o trasgo se virou e brandiu o bastão, enquanto Harry continuava agarrado nele tentando escapar da morte, a qualquer instante, o trasgo ia arrancá-lo do pescoço ou dar-lhe uma tremenda porretada.
Hermione afundara no chão de tanto medo, Rony puxou a própria varinha sem saber o que ia fazer, ouviu-se gritando o primeiro feitiço que e veio a cabeça:
— Vingardium leviosa!
Na mesma hora o bastão voou da mão do trasgo, ergueu-se no ar, foi subindo, subindo, virou-se lentamente e caiu, com um barulho feio, na cabeça do seu dono. O trasgo cambaleou e, em seguida, caiu de cara no chão, com um baque que fez o banheiro todo sacudir.
Harry se levantou. Tremia sem fôlego. Rony continuava parado com a varinha no ar, espantado como que fizera.
Foi Hermione quem falou primeiro.
— Ele está... morto?
— Acho que não — respondeu Harry — Acho que só perdeu os sentidos.
Ele se abaixou e puxou a varinha da narina do trasgo. Estava suja de uma coisa que parecia uma cola grumosa.
— Eca... meleca de trasgo.
E limpou a varinha nas calças do trasgo.
De repente o barulho de portas batendo e passos pesados fizeram os três erguerem a cabeça. Não haviam percebido a confusão que tinham aprontado, mas com certeza alguém lá embaixo ouvira a pancadaria e os urros do trasgo. Um instante depois a Profª. McGonagall adentrou o banheiro, seguida de perto por Filch e Quirrell, que fechava a fila. Quirrell deu uma espiada no trasgo, soltou um gemidinho e sentou-se depressa em um vaso sanitário, apertando o peito.
Filch debruçou-se sobre o trasgo. A Profª. McGonagall ficou olhando para Rony e Harry. Harry nunca a vira tão zangada. Seus lábios estavam brancos. A esperança de ganhar cinqüenta pontos para Grifinória desapareceu logo da cabeça de Harry.
— O que é que vocês estavam pensando? — perguntou a Profª. McGonagall, com uma fúria reprimida na voz, Harry olhou para Rony, que continuava parado com a varinha no ar — Vocês tiveram sorte de não serem mortos. Por que é que não estão no dormitório?
Filch lançou a Harry um olhar rápido e penetrante. Harry olhou para o chão. Desejou que Rony baixasse a varinha. Então se ouviu uma vozinha que veio das sombras.
— Por favor, Profª. McGonagall, eles vieram me procurar.
— Srta. Granger!
Hermione conseguira finalmente se levantar.
— Sai procurando o trasgo porque achei que podia enfrentá-lo sozinha. Sabe, já li tudo sobre trasgos.
Rony deixou a varinha cair. Hermione Granger, contando uma mentira deslavada a um professor?
— Se eles não tivessem me encontrado eu estaria morta agora. Harry enfiou a varinha na narina do trasgo e Rony derrubou ele com o próprio bastão. Não tiveram tempo de chamar ninguém. O trasgo ia acabar comigo quando eles chegaram.
Harry e Rony tentaram fingir que a história não era novidade para eles.
— Bem... nesse caso... — disse a Profª. McGonagall encarando os três — Srta. Granger, que bobagem, como pôde pensar em enfrentar um trasgo montanhês sozinha?
Hermione baixou a cabeça.
Harry perdera a fala. Hermione era a última pessoa do mundo que desobedeceria ao regulamento e ali estava fingindo que desobedecera, para tirá-los de uma enrascada. Era o mesmo que o Snape começar a distribuir balinhas.
— Hermione Granger, Grifinória vai perder cinco pontos por isso — disse a Profª. McGonagall — Estou muito desapontada. Se não estiver machucada é melhor ir embora para a Torre da Grifinória. Os alunos estão acabando de festejar o Dia das Bruxas em suas Casas.
Hermione se retirou.
A Profª. McGonagall virou-se para Harry e Rony.
— Bem, eu continuo achando que vocês tiveram sorte, mas não há muitos alunos do primeiro ano que pudessem enfrentar um trasgo montanhês adulto. Cada um de vocês ganha cinco pontos para Grifinória. O Prof. Dumbledore será informado. Podem ir.
Eles saíram depressa do banheiro e não falaram nada até subirem dois andares. Foi um alivio se afastarem do fedor do trasgo, para não falar do resto.
— Devíamos ter ganho mais de dez pontos — resmungou Rony.
— Cinco, você quer dizer, depois de descontar os pontos que Hermione perdeu.
— Foi legal ela ter-nos tirado do aperto — admitiu Rony — Mas não se esqueça, salvamos a vida dela.
— Talvez ela não precisasse ser salva se não tivéssemos trancado a coisa com ela — lembrou Harry.
Tinham chegado ao retrato da Mulher Gorda.
— Focinho de porco — disseram e entraram.
A Sala Comunal estava cheia e barulhenta. Todo o mundo estava comendo o jantar que fora mandado para lá.
Hermione, porém, estava parada sozinha do lado da porta, esperando por eles. Houve um silêncio constrangido. Depois, sem se olharem, todos disseram “Obrigado!” e correram para apanhar os pratos. Mas daquele momento em diante, Hermione Granger tornou-se amiga dos dois.
Há coisas que não se pode fazer junto sem acabar gostando um do outro, e derrubar um trasgo montanhês de quase quatro metros de altura é uma dessas coisas.
continua...
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